Perco-me entre o labirinto de linhas desta folha. Não sei como começar. Não sei nem ao menos sobre o que falar. Quero apenas escrever uma bela história, discorrer sobre algo que seja confortável para os que venham a ler estas linhas, e que possa tranqüilizar o incontentável escritor que aqui brinca com palavras, juntando um quebra cabeças para fazer de pequenas trapalhadas uma grande obra de arte. Passo a mão sobre o rosto, rabisco a gramática. Esmurro o dicionário. Imploro por inspiração.
Minha paciência se esvai, penso, penso. Lamento. Procuro nas paredes, nos corredores, na mesa, mas nada me soa aceitável e digno de ser descrito. Tanto já foi feito que julgo impossível algo novo surgir de uma mente insana. Bato minha cabeça contra a mesa, mas nada me sai. Levanto, estico os braços, abro as janelas e sinto a brisa da madrugada abraçar meu corpo com a delicadeza e a ternura das mãos de seda de uma princesa. Sento-me novamente. Escrevo uma linha, duas, três. Enfureço-me e rasgo-a com ira.
Levanto-me. Com passos de um velho alcanço à estante e dela arranco a empoeirada gramática que ali jaz há algum tempo. Esfolheio-a com impaciência, como se dela fosse brotar a tal história que tanto procuro. Quando dou por mim vejo-a repleta de anotações sem juízo, completa por palavras soltas. Paro. Respiro. Inspiro. Procuro pelo dicionário. Encontro-o, nele busco por palavras que possam expressar o que tento escrever. Palavras que possam fazer de meus pensamentos palavras, e palavras que venham formar minha história. Deparo-me com verbos, substantivos, adjetivos, pronomes e advérbios de A a Z e de toda uma análise morfossintática não aproveito nada.
Banho meu rosto com a gélida água da madrugada. Olho para o relógio e percebo que o tempo se foi, seus ponteiros apostam uma louca corrida contra o tempo, mas quem perde sou eu. Deito-me no sofá e encontro o conforto pelo qual meu corpo tanto rogava. Fecho os olhos. Da minha mente saltam imagens estranhas, frases feitas, linhas, curvas e cores parecem-me mais um festival de sentidos, pois posso ver, sentir, ouvir e até mesmo tocar as ilusões que me rodeiam. Abro os olhos e todas as ilusões trancam-se no fundo do meu inconsciente. Busco em minha consciência uma resposta, mas um pano branco a envolve completamente.
Pego meu violão, contemplo algumas notas soltas que acabam embalando uma bela melodia, e entre sua nuança surge-me teu rosto. Recordo-me perfeitamente do teu sorriso. Desta vez fecho os olhos e sinto teu toque. Respiro, e contemplo teu perfume difundido na suave brisa do amanhecer. A luz do sol banha meu rosto com a mesma pureza que a inspiração surge perante meus olhos. Pego novamente uma folha de papel e decido escrever sobre o amor. Mas tudo o que sou capaz de dizer é o que sinto, mas o que sinto não é cabível em palavras, contudo enquanto estiveres ao meu lado poderei dizer-te tudo apenas com o olhar.